Neste artigo falaremos um pouco sobre a questão
da legitimidade da contracepção em geral. As Escrituras não mostram de forma
direta se é biblicamente apropriado ou não usar métodos contraceptivos. Não há
passagem bíblica que menciona explicitamente o termo “contracepção”, como
também não há textos que indiquem de modo específico se é apropriado ou não
usar métodos contraceptivos. Nem por isso, contudo, devemos supor que as
Escrituras não têm nada a dizer a respeito desta questão.
Em Gênesis 1:28 vemos que a principal finalidade
da união conjugal é a procriação: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a
terra”. No salmo 127:3 vemos que os filhos são bênção de Deus: “Herança do SENHOR
são os filhos; o fruto do ventre, o seu galardão” e no Salmo 128:3 diz que o
homem que teme a Deus encontrará felicidade no lar, “seus filhos serão como
rebentos da oliveira, à roda da tua mesa”. Ter filhos é a norma esperada dos
casamentos e deve ser entendido como uma boa dádiva de um Pai celestial
amoroso. Devemos rejeitar essa mentalidade contraceptiva que considera a
gravidez e os filhos incômodos a serem evitados, e não dádivas a serem
recebidas, amadas e cuidadas (KOSTENBERGER; JONES, 2011, p.130-132).
Mesmo que a finalidade biológica do sexo
seja a procriação, conforme afirma C.S. Lewis em seu livro “Cristianismo puro e
simples”, ele faz um paralelo útil com o apetite alimentar, ou seja, mesmo que
o propósito biológico de comer seja de restaurar o corpo, podemos comer com
apetite, apreciar e degustar a textura dos alimentos de forma que Deus seja glorificado
(1 Co 10:31). No que diz respeito ao sexo, Deus dá ao homem o desejo e o apetite
sexual porque quer que ele tenha muitas relações sexuais com sua esposa e encontre
prazer (CHALLIES, 2011, p.52-53).
Afinal, deve-se concluir então que todo ato
sexual precisa estar aberto para a concepção? Há pessoas que afirmam que sim,
citando Gênesis 38:6-10. Nesta passagem vemos o relato de Onã e Tamar. Deus
tirou a vida de Er o primogênito de Judá por ser um homem perverso, e deixou
sua esposa Tamar viúva. O costume hebraico conhecido como casamento de levirato
(Dt 25:5-10) determinava que quando um homem casado morria sem deixar
descendentes a viúva devia se casar com o parente mais próximo do falecido. O primeiro
filho desse casamento subsequente levaria o nome do irmão mais velho e se
tornaria herdeiro dele. Onã, próximo irmão de Er, devia assumir a
responsabilidade de dar um filho a Tamar, porém, apesar de Onã ter relações
sexuais com Tamar, ele evitava que ela concebesse ao retirar-se antes da ejaculação.
O texto diz que ele “derramava o sêmen no chão” e “o que ele fazia era mau aos
olhos do Senhor (Gn 38:9-10).
Os católicos romanos costumam citar essa
passagem para sugerir que o Senhor se desagradou particularmente da interrupção
do processo sexual para evitar a procriação. De acordo com essa postura, todos
os meios de contracepção que interrompem o processo natural de procriação são
contrários à vontade de Deus (Papa Paulo VI, Humanae Vitae, p. 14-17). Ao examinar
melhor o texto vemos que o desprazer do Senhor em Gn 38:10 não estava associado
diretamente à prevenção da gravidez em si, mas sim, ao modo particularmente
explorador, abusivo e desperdiçador como Onã se relacionava sexualmente com
Tamar. A questão aqui era que Onã não estava cumprindo sua obrigação de dar um
descendente a Tamar, e a pena não era morte, mas humilhação (Dt 25:9-10).
Deus criou o casamento para outros fins
além da procriação, pois deve haver companheirismo por meio do vínculo conjugal
(Gn 2:18,24), prazer sexual (Pv 5:15-23; Livro de Cântico) e fidelidade (1 Co
7:1-9).
Portanto, não é correto afirmar que em
toda relação sexual o casal deva abster-se do uso de contraceptivos. Essa ideia
de que absolutamente cada um dos atos sexuais dentro do casamento deve estar
aberto à procriação vai além das exigências bíblicas. No próximo artigo
falaremos sobre as formas moralmente permissíveis e não permissíveis de
contracepção, até lá!
REFERENCIAL
TEÓRICO
KOSTENBERGER,
Andreas J; JONES, David W. Deus,
casamento e família: reconstruindo o fundamento bíblico. São Paulo: Vida
Nova, 2011.
Nenhum comentário:
Postar um comentário