A personalidade humana não é jamais
autossuficiente. Ela não pode ser autônoma. Nem conhecer a si mesma a partir de
si mesma.
“Quando eu era menino, falava como menino, pensava
como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem, deixei para trás
as coisas de menino. Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em
espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então,
conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido”
A
personalidade humana é conhecida pelo caráter. O caráter é a qualidade
distintiva da pessoa, o conjunto de traços particulares, face, fisionomia,
natureza (2 Co 4:4), o modo de ser do indivíduo, firmeza e coerência,
propriedade, adequação, domínio próprio (2 Co 3:18), e pela qualidade especial
do batismo (1 Pe 3:21).
Cristo é
a água essencial da vida, transformadora e purificadora do caráter humano por
meio do poder do seu sangue mediante a ação da Palavra e pelo Espírito. Ele é o
pão substancial da vida, que nutre a alma e corpo, a própria Palavra e
Espírito.
“Jesus
lhes disse: "Eu lhes digo a verdade: Se vocês não comerem a carne do Filho
do homem e não beberem o seu sangue, não terão vida em si mesmos. Todo o que
come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei
no último dia. Pois a minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é
verdadeira bebida. Todo o que come a minha carne e bebe o meu sangue permanece
em mim e eu nele. Da mesma forma como o Pai que vive me enviou e eu vivo por
causa do Pai, assim aquele que se alimenta de mim viverá por minha causa. Este
é o pão que desceu do céu. Os antepassados de vocês comeram o maná e morreram,
mas aquele que se alimenta deste pão viverá para sempre" (João 6:53-58)
O diálogo
com Deus nos identifica com a unidade e pluralidade do ser de Deus e nos
capacita à formação de uma identidade pessoal e comunal.
“Aprendi
a viver contente em toda e qualquer situação” disse o Apóstolo Paulo em sua
carta aos Filipenses 4:11,13). A palavra “contente” (altarkes) aqui é a mesma
usada em 2 Co 9:8 (autarkeia), e diz respeito à uma autossuficiência que provém
da autossuficiência de Deus. A palavra suficiência (hikanotes) em 2 Co 3:5 significa
capacidade, habilidade, competência. Assim, o que realmente torna-nos
suficientes (“autárquicos”) é a derivação de poder do caráter divino mediante a
união e participação com o seu Filho (GOMES; 2017, p. 241).
Assim
como o Filho veio para satisfazer a vontade do Pai, assim o homem encontra a si
mesmo em Cristo quando se satisfaz a fé na vontade graciosa de Deus. O homem
que se declara autossuficiente não precisa de Deus, pois ele está sempre
buscando algo que possa lhe trazer alegria a satisfação, porém, se alguém não
crer a ponto de comer a carne do Filho do Homem e não beber o seu sangue, não
terá vida em si mesmo. Sofrerá o peso da glória de Deus em justiça sobre o
pecado e será esmagado ao chão sob o peso de suas insatisfações e frustrações
(GOMES; 2017, p. 243).
A glória
de Deus é pesada (kavod, hb., glória, peso ou pesado), mas a glória de Deus
revelada em Cristo se torna leve para o homem no reflexo da beleza de Cristo.
Esta mensagem é escândalo e loucura para os que se perdem (1 Co 1:21), a
autoglorificação não produz só escândalo, mas traição. Muitas pessoas
desistiram de ouvir a Jesus porque não podiam olhar para ele de frente. Essas
pessoas passam a vida em busca do contentamento, mas o segredo da vida não está
na busca, mas no encontro, e este encontro é com Cristo.
Quando
nos isolamos de Deus, como seres autônomos, só nos resta desregramento moral e
a frustração. Tudo tem a ver com o ponto de referência, e Deus é o nosso ponto
de referência, como seres teorreferentes.
Jesus
quando encontrou com a mulher samaritana na cidade de Sicar na região de
Samaria, ocorreu um diálogo sobre a água viva (Jo 4). Jesus estava cansado, e
sentou junto a fonte de Jacó, e nisso aproximou-se uma mulher samaritana que
vinha à fonte para buscar água. Jesus pediu-lhe: “Dá-me de beber” (Jo 4:7). A
mulher mostrou surpresa com o início da conversa por causa do preconceito
religioso que havia entre os judeus e samaritanos. No Antigo Testamento lemos
que a região de Samaria foi atacada pelo Rei da Assíria, os israelitas foram
levados cativos para a Assíria, e sua descendência foi da gente pagã da terra
do cativeiro. O Senhor demonstrou que o problema não estava na controvérsia
entre judeus e samaritanos, mas na necessidade de transformação e da
purificação do novo nascimento. Jesus
foi ao encontro da necessidade da mulher samaritana por meio da exibição de sua
própria necessidade humana: “Dá-me de beber”.
As pessoas
falham na localização da verdadeira fonte e na identificação da verdadeira
necessidade. Todos os meios e tentativas de suprir suas próprias necessidade
são frustradas, pois “não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do
que as vestes?” (Mt 6:25).
A mulher
samaritana disse: “Senhor, dá-me dessa água para que eu não mais tenha sede,
nem precise vir aqui busca-la” (Jo 4:15). A resposta de Jesus não pareceu de
imediato responder à sua necessidade: “Vai, chama teu marido e vem cá” (v.16).
Jesus está bem consciente de que todos possuem carência últimas de vida, que
transcendem as necessidades imediatas. Jesus está elevando os olhos da mulher
samaritana acima do “aqui e agora”. Ele volta o olhar dela para questões
eternas (“uma fonte a jorrar para a vida eterna”).
“Tudo fez
formoso no seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem
que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até ao fim”
(Ec 3:11).
A
expressão do desejo da mulher samaritana implicava sede geral do seu coração. Corpo
e alma tinham sede satisfação, e o Senhor respondeu à sua necessidade mais
profunda, pois só ele conhecia seu coração.
A mulher
samaritana responde: “Não tenho marido”(v. 17). A mulher tinha uma vida
irregular, não somente pelo número de companheiros que havia tido (cinco
maridos), mas pelo homem atual que se relacionava e que não era seu marido.
Jesus pressiona sua consciência sem acusá-la, e acha um ponto positivo na honestidade
da mulher (“Bem disseste”). A sede de relacionamentos da mulher samaritana era
grande, maior do que a sede de água. Da mesma forma como buscava água na fonte
de Jacó, a cada dia, a mulher samaritana tinha buscado satisfação relacional em
alianças com homens de forma irregular, eram fontes rotas que não retinham água
(Jr 3:13).
Deus é o
nosso único ponto de referência. Nossa personalidade é analógica, se não refletirmos a glória de Deus, refletiremos trevas
à guisa de luz (Mt 6:22,23); nossa personalidade é pactual, se não compactuarmos com Deus, faremos aliança de
aproximação com os homens; nossa personalidade é dialogal, se não falarmos com Deus por meio da sua Palavra e da
oração, ouviremos e responderemos a vozes de ídolos. A religiosidade idólatra
precisa sempre de um referencial visível para a fé autocentrada.
A fé
centrada no homem e nas coisas do homem, e não em Deus, se define como “fé na
fé”, isto é, como uma certeza de coisas que se presumem em função da convicção
de fatos apenas observados, e ela mesma servirá de maldição (Hb 6:7,8). É a fé na
graça que dá ao homem o referencial divino para o conhecimento de Deus, de si
mesmo, e do outro, e a observação e a explanação adequada da realidade presente
e por vir (GOMES; 2017, p. 201).
Se Deus
não for nosso ponto de referência, outra coisa o será, a busca por satisfação
em relacionamentos, carreira profissional, currículo acadêmico, terminarão em
frustração e insatisfação, pois a pessoa que se declara autossuficiente nunca
sentirá a verdadeira alegria e satisfação, pelo contrário, sofrerá o peso da
glória de Deus em justiça sobre o pecado, pois fomos criados para refletir a
imagem de Deus, para glorificá-lo, mas sem Cristo, o peso será insuportável.
O segredo
da verdadeira alegria e satisfação não está naquilo que você tem buscado para o
seu contentamento, mas naquilo que você tem evitado, o encontro frente a frente
com a verdadeira fonte que revela a verdadeira necessidade do seu coração, Cristo
Jesus!
REFERENCIAL TEÓRICO:
GOMES,
Wadislau Martins. Personalidade Centrada
em Deus. Brasília: Monergismo, 2017.
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